estória§136


Mais um ano a chegar ao fim. Tanta coisa aconteceu. Tanta coisa que irá ficar aqui em 2012. Tanta coisa que se arrumou no sótão. Mas que não deixará de fazer parte da nossa bagagem. Umas coisas boas, outras menos boas. Faz parte. É isso a vida. Mas sobrevive-se a tudo. E a prova é que mais um ano vem aí. Mais um ano cheio de oportunidade para vingar e ser feliz. Para darmos mais de nós. Para recebermos mais dos outros. Para termos coragem para fazer o que não se conseguiu, independentemente do motivo. Para fortalecer amizades. Para encontrar novas amizades. Para sermos nós. Para sermos melhores. Sobretudo, para sermos felizes com os outros que mais gostamos. E, depois, juntamos um bocadinho de sorte, que também é preciso. Que a vida nos sorria, para ser mais fácil sorrir-lhe de novo.

*Um bom ano 2013 a todos*

estória§135


Acordas um dia de manhã. Um dia banal como qualquer outro, pensas tu. Acordas, arranjas-te, fazes as tuas coisinhas e não te passa pela cabeça que aquele pode ser um dia diferente. Que aquele dia vai-te trazer um sorriso. Que te vai ajudar a encontrares um novo caminho.

As melhores coisas acontecem quando menos se espera, mesmo que ansiemos por isso todos os dias. Vai haver um momento, nem que sejam segundos apenas, em que não estaremos a pensar nisso. E é aí, numa dessas alturas. É aí que isso vai acontecer.
It’s true.

estória§134


Há que andar para a frente. Pegar nas nossas bagagens e seguir com as coisas. Se não dá para ir pelo caminho que queríamos, que gostávamos, há que ser corajoso o suficiente para ir por outro. Olhar em frente. Cabeça erguida. Sorriso na cara. Mapa nas mãos e avançar. O que custa é o primeiro passo. Depois de se estar a caminho, a sensação é reconfortante. Há um todo novo a descobrir. Não ter medo do que possa vir. Não ter pena do que não aconteceu. Não podemos ficar presos ao passado, com alguém me disse. Coisas boas se vão, para coisas melhores virem. É esse o pensamento. É esse o espírito. 

estória§133


E estava a olhar para o vazio, embrenhada nos meus pensamentos quando vi o amor, mesmo ali à minha frente. Amor verdadeiro. Um dos tipos de amor verdadeiro. Eles iam a passear, de mão dada. Ele com um ar protector e ela com um sorriso ténue no rosto, mas que se evidenciava no seu olhar. Contudo, eles tinham uma particularidade: as suas peles traziam os anos consigo, rugas de vida pela cara e mãos de ambos. Pensei: ainda há amores assim.

estória §132



E tenho a sensação que vais ficar cá dentro para sempre. 

Mas espero que um dia te vás embora daqui. Ou então que apenas sinta um carinho especial, como quando relembramos bons momentos com pessoas que nos tocaram e foram, de um certo modo, especial para nós num dado momento da nossa vida. Sim, é isto que eu quero de ti. É apenas isto que eu posso ter. É com isto que me quero contentar.

estória §131

Ainda tanta coisa cá dentro. É um aperto tão grande. As coisas passam como um filme antigo. E revejo as cenas uma e outra vez. Imparável. Mesmo que doa. É imparável.

Ainda daria tudo para isso. Para [te] sentir de novo. 

estória §130


Eu queria ter de novo o que houve. Tenho saudades disso. Queria mais. Mas há um tempo para tudo. E o tempo desses bons momentos já lá vai. Agora é tempo de arrumações. Vou recolher tudo. Limpar o espaço. Às vezes é necessário. E esta é uma altura em que é mais que necessário. É fundamental. Há que guardar tudo o que não faz falta. [Apesar de ao mesmo tempo sentir falta.] Nestes casos não se deita fora. Não quero fazer isso. Há coisas que foram muito importantes para mim. [Foste importante. Sim.] Por isso, há que guardar. Uma vez que já não “me servem”. Quer dizer, não as posso ter no meu dia-a-dia. Por mais que ainda as queira. [Mesmo ainda te querendo.] Então, há que guardar. Transformá-las em recordações. Tão só e apenas isso. Recordações.

[Guardar-te numa das tantas gavetas da tal cómoda.]

estória §129


Perdi a corrida. Fiquei para trás. Nada de nada pode ser tomado como certo. De repente tudo muda. E dói. 

["dóis-me"... ]

estória §128


Por vezes tudo o que queremos é uma oportunidade. Uma segunda oportunidade. Para fazer diferente. Para ser melhor. Afinal, é para isso que elas existem. Agora, dentro da oportunidade, as coisas parecem diferentes. Tem que se recomeçar. Queria recomeçar do meio da corrida. Mas, entretanto perdeu-se a pedalada, o tempo passou por nós e não se pôde acompanhá-lo. Voltámos atrás. Tem que se recomeçar quase da partida. Não queria bem assim. Mas tem que ser. Recomeçar do início. Sem expectativas. Um passo de cada vez. E nesse passo, dar o melhor. E esperar. Esperar para ver o que se alcança.

(era [quase] o que eu queria, mas tenho medo*)

estória §127


É como um pedaço de plasticina. Se deixado ao ar muito tempo sem se moldar, acaba por secar. Quando voltamos a olhar para esse pedaço de plasticina, está feio, rijo e com fissuras. E pensamos em voltar a moldá-lo. Mas é então que nos deparamos com um grande problema. Assim que tocamos nesse pedaço e o envolvemos com as mãos, este começa-se a partir aos bocadinhos. Abrimos as mãos e qual é o nosso espanto quando reparamos que está tudo esfarelado. Olhamos um pouco desiludidos e pensamos que não vai haver muito mais a fazer para aquilo poder voltar ao original. O melhor é deitar fora. Por momentos pensamos isto. Mas há algo, que não sabemos bem o quê, que nos retém um pouco. Acabamos por pegar bocadinho a bocadinho e juntar. São bocadinhos tão pequeninos. Ninguém dá nada por eles. Mas ao juntar uns com os outros, a coisa vai tomando forma. Todos esses bocadinhos vão ficando mais macios, mais maleáveis e recomeçamos a ter esperança que aquilo afinal volte ao normal. É uma luz ao fundo do túnel. Mesmo que pequenina, ganhamos força para continuar a juntar todos os bocadinhos. Afinal, há algo que se pode fazer e nada está perdido. Aquele pedaço de plasticina deixado com o tempo vai voltar à sua consistência habitual. E ficamos felizes porque conseguimos isso de volta. Agora sabemos que temos que o continuar a moldar todos os dias. Se não este acaba por voltar a secar e aí, bem, teremos que recomeçar, mais uma vez.
Afinal, todos aqueles bocadinhos insignificantes, que pensávamos não dar em nada... Afinal, se tivermos paciência, coragem e vontade, conseguimos fazer com que se (re)transforme em algo.
É assim com a amizade. É assim com o amor. [Penso eu].

estória §126


Há dias em que tenho a força toda do mundo dentro de mim. [Sinto mesmo como se isso pudesse acontecer.] Hoje estou decidida a ir por um caminho que me agrada bastante. [Ou melhor, retomar.] Na verdade, é o que me deixa mais feliz. E hoje estou certa que quero isso a 100%. Que vou fazer de tudo para voltar a esse caminho. Que vou pegar nas pedras que encontrar e vou construir um castelo. É, não é? Eu sei que há pedras no caminho. Se não houvessem… Bem, se não houvessem, tinha-se continuado este mesmo caminho que se deixou para trás há uns tempos. Por isso, eu sei com o que conto. Sei que as pedras estão lá e que há coisas a resolver. Há que tentar. Se não tentarmos, nunca saberemos o que poderia acontecer a partir dali. 
Hoje, apenas, estou cheia de coragem para fazer isso. [Pena não estares aqui.]

estória §125


Por vezes há medo e inseguranças no meio do que mais desejamos. É normal. [penso]. É normal que se tenha medo de perder esse algo, ou simplesmente medo de se fazer alguma coisa errada no caminho. Porque sabemos que não somos perfeitos e que cometemos erros, alguns sem darmos conta. E isso pode ser a "morte do artista". E por sabermos isso, temos medo e insegurança. Porque não queremos que as coisas corram mal. E  também não queremos sentir-nos assim. Incapazes, que não somos bons o suficiente para algo. Porque, afinal, só queremos algo. Muito.

estória §124


Já era noite, lembro-me. Estava-se numa festa, não sei bem onde. Uma dessas festas de verão, típicas desta altura do ano. Pessoas por todo o lado. Barulho por todo o lado. Luzes por todo o lado. Havia um espetáculo qualquer prestes a começar e as pessoas dirigiam-se para lá. E nós também. Ficámos a porta por momentos. E parecia que mais nada havia à volta. Eu estava feliz de estar contigo. E tu também parecias feliz por estares ali. Olhares cúmplices, sorrisos e abraços fizeram a noite. Não me recordo mais do sonho, mas foi o suficiente para acordar [ainda mais] com o coração apertado de saudades tuas.



estória §123


Existem várias metas ao longo da vida. Todos temos um certo conjunto de metas, algumas já pré-definidas há algum tempo, outras que mudam e deixam de existir, e outras ainda que surgem sem termos pensado nisso. Cheguei a uma dessas metas que tinha definido para mim. E posso afirmar que cheguei feliz. Cansada, com esforço, mas feliz no fim. Foi o que eu quis e, apesar de ser um pouco difícil ao princípio, continuei, tentei e consegui. Sim, orgulhosa de mim mesma. Por ter conseguido e por ver que as pessoas essenciais também ficam orgulhosas. É uma sensação tão boa, que me deixa tão bem e feliz. É bom ver que os outros têm orgulho em nós, que gostam de nós e que nós os conseguimos deixar assim. É bom ter o reconhecimento dos outros e ver a felicidade nos nossos olhos e nos deles.

estória §122


O querer nem sempre é o suficiente. Ela pensava que sim. Mas enganou-se. Ela pensava que quando uma pessoa queria muito, que conseguia isso, que o mundo conspirava todo a favor disso. Mas enganou-se. O querer nem sempre é suficiente quando isso também depende de mais alguém. Porque é preciso dois “querer” para no fim o resultado dar positivo. Pois “mais” com “menos” dá "menos". Por mais que o “mais” seja grande, ele não vence o “menos”. O que é pena. Não basta uma pessoa querer muito, desejar muito isso, afirmar que daria tudo e mais alguma coisa. Isso não chega e não leva a lado nenhum. Ela concluiu isso, com pena. Ela nunca teve tanta pena de o resultado ser “menos”. 

estória §121


Queria ser forte o suficiente para seguir em frente. Não gosto de incertezas. Queria respostas. Não as tens e eu tenho que ser forte o suficiente para seguir outro caminho. É altura de pegar no mapa e ver outra direcção. Ou então arriscar e ir à descoberta. Virar para um sítio qualquer. Novo. E não ficar a tentar ir por um que, por mais que avance, parece que não saio do mesmo lugar. Eu queria muito continuar a ir por este caminho, mas para ir sozinha tenho que ir por outro. Tenho que pensar seriamente nisso. Qual o outro caminho que posso começar a ir.
“E quando à tua frente se abrirem muitas estradas e não souberes a que hás-de escolher, não metas por uma ao acaso, senta-te e espera. Respira com a mesma profundidade confiante com que respiraste no dia em que vieste ao mundo, e sem deixares que te distraia, espera e volta a esperar. Fica quieta, em silêncio, e ouve o teu coração. Quando ele te falar, levanta-te, e vai para onde ele te levar.”       *Susana Tamaro

(Eu não queria nada que fosse assim...)

estório §120


Ela não contava com ele. Ou melhor, ela não contava com ninguém. Não estava à espera que alguém novo fosse aparecer na sua vida. Mas ele veio. Ele entrou de um modo estranho na vida dela. E foi ficando. E ela começou a gostar. E gostou rápido, como lhe acontecia sempre que começava a gostar de alguém. Ele continuou lá. Mesmo quando não estava pessoalmente, ele continuava presente no seu pensamento [e continua]. Coisas boas foram acontecendo. Coisas que a deixavam feliz. Ele deixava-a feliz. Mas ela sempre teve medo e mostrava-se insegura. No fundo, ela tinha medo que isto fosse como era das outras vezes que gostava de alguém. E acabou por ser. Afastaram-se sem, se calhar, se darem conta, sem o quererem fazer. Mas estava a acontecer. Houve falhas. Ela não queria aquilo. Ela tinha certezas. Do que sentia. Do que queria. Apesar disto, duvidava dele. Ele não tinha certezas. As coisas para ele tinham desaparecido. E isso já não a deixava feliz. Mas antes com saudades. Saudades dele. Do que existiu. E, principalmente, do que poderia ter existido.

estória §119


O tempo podia voltar para trás. Às vezes isso podia acontecer. Podermos voltar para trás. Saltar de momento em momento. Relembrar exactamente o que se viveu, onde se estava, com quem se estava, o que se sentiu, o que aquilo provocou em nós, o que aquilo deixou em nós. E mais. Poder mudar, poder reagir de outro modo, ter outra atitude, dizer coisas diferentes. Ou simplesmente deixar tudo como foi e apenas reviver.

estória §118


É difícil. Às vezes há coisas difíceis. Esta é uma delas. Porque há coisas que me fazem simplesmente lembrar de ti. Porque, pior ainda, não é preciso nada para me lembrar de ti. Porque surges no meu pensamento sem pedir licença e entras sem esperar que eu te dê permissão. Porque há coisas que simplesmente queria poder partilhar contigo. Porque me faria feliz poder partilhar o que me deixa feliz. Porque quando gostamos de alguém é assim. 

estória §117


Porque é bom estar com quem gosta de nós. Com quem podes ser tu, por mais estúpido que sejas, por mais figuras que faças, mesmo que não saibas dançar, fales alto, fiques demasiado alegre com pouco. Porque é bom poderes ser assim ao pé delas. Porque sorris junto. Porque se conta coisas sem dizer nenhuma palavra. E se conta nada de jeito dizendo tudo e mais alguma coisa. Porque fazemos rir quando é preciso. Porque nos divertimos e fazemos palhaçadas. Mas porque estamos lá para tudo e para cada uma.

estória §116


Estar à espera é das piores coisas que me pode acontecer. Estar à espera de algo que depende do que eu já fiz mas que agora não depende de mim, em que eu não posso fazer nada para apressar isso, ainda é pior. O coração fica apertado, com medo. A cabeça começa a pensar [ainda] mais e instala-se um turbilhão de ideias que não têm nada bom aspecto. Considero-me uma pessoa paciente, mas se calhar não sou assim tanto. No meio disto tudo, nasce em mim uma ansiedade que fica difícil de controlar e me deixa de um certo modo incapacitada para fazer outras coisas. Parece que só vejo aquilo à frente, o motivo da espera. Digo para mim mesma que não vale a pena ficar assim, pois isso não vai diminuir a espera. Mas não sou convincente para mim mesma. 

estória $115


Por vezes, quanto mais se pensa pior é. Há que ter a cabeça no lugar e ponderar as coisas. Mas há coisas que não são para ser ponderadas. São para ser sentidas. E assim, quando mais se pensa, mais se baralha o que se sente. Eu tinha uma certeza, ou algumas certezas. Estava sol. E eu tinha certeza disso. Estava aquele sol que nos aquece alma. Como eu tanto gosto. E digo mais uma vez, que eu tinha a certeza. Mas depois algo muda. O céu muda. Aparecem as nuvens e o vento. A alma começa a arrefecer. E as nuvens teimam em ficar. E é aí que se começa a pensar. Pensa-se e torna-se a pensar. Às tantas, já não se faz mais nada se não isso. E depois… E depois perdemo-nos nessa confusão que se instala de tanto pensar. Ansiamos por um mapa. Ansiamos por alguma orientação. Mas não há. Nisto não há mapas. Não há caminhos traçados que possamos seguir. Nisto há apenas sentimentos. Há apenas aquele sol que nos aquece a alma.

estória §114


E vi-te. Era como se fosse um daqueles dias, em que se está em casa, sem fazer nada, sem pensar em nada. E pensasse em ir à janela, ver como corre o mundo lá fora. Desarredasse a cortina um pouco e espreita-se para a rua. E vê-se as pessoas a andarem, a falarem, a fazerem a sua vida. E de repente, no meio de tantas pessoas, os nossos olhares cruzam-se. Eras tu. Olhámos um para o outro, mas tu desviaste a cabeça e continuaste o teu caminho. Eu fiquei ali com o coração apertado, sem saber muito bem como reagir. Foi como se te tivesse a ver de uma janela. Tão perto de ti como não estava à tanto tempo e distante ao mesmo tempo. Mas também depois afastei-me, pus a cortina da janela bem e vim para dentro. Lembrei-me que tinha coisas mais importantes para fazer que estar contigo no pensamento.

estória $113


Porque as coisas nem sempre acontecem como gostávamos. Porque a vida nem sempre nos dá o que queríamos. De um momento para o outro, tudo pode mudar. De um momento para o outro, fica tudo do avesso. E na nossa cabeça passa tudo e mais alguma coisa a alta velocidade. E surgem novos comportamentos, novos sentimentos. Ficamos baralhados sem saber muito bem o que fazer. Mas temos que aprender que é assim. Nós queríamos laranja, para poder fazer um bolo bem grande e com um aspecto delicioso! Daqueles que basta olhar para ficarmos com uma sensação tão boa! Ao invés, a vida deu-nos limões… Limões?! Que raio! Eu queria uma coisa bem doce, não limões… A única coisa a fazer é ir comprar quilos de açúcar para a limonada ficar bem docinha. Sim, açúcar é que é preciso agora. 

estória $112


Os gestos pesam muito. Têm grande importância. Definem uma pessoa e mostram os seus sentimentos. Por gestos demonstra-se por vezes o que não se consegue transmitir por palavras. E no fundo, o que fica na memória são os gestos que as pessoas têm para connosco. É o que fica daquela pessoa. Porque ao lembrarmos isso, lembramos o modo como nos sentimos com ela, o que nos fez sentir numa dada altura, num dado momento. Contudo, as palavras também têm a sua cota parte nisto tudo. Dizem que ‘palavras, leva-as o vento’. Bem, a longo prazo isto até pode ser verdade. A pessoa esquece, as memórias não são tão claras do que ouvimos dos outros, podemos relembrar a ideia geral, mas o que fica gravado são o que fizeram. Agora a curto prazo.. As palavras têm um impacto imediato. Dizem algo e aquilo entra em nós. E fica lá a ressoar por uns momentos. E acreditamos naquilo que nos disseram. Que pode ser verdade ou não. E nesta parte, os gestos ajudam a confirmar isso. Os gestos podem ou não ir de encontra às palavras. Mas, tal como as palavras têm impacto, a falta delas também. Uma pessoa pode ser só gestos. Gestos para tudo e mais alguma coisa. E isso é bom. É o que vai ficar, certo? Mas por vezes uma pessoa precisa de ouvir de outra aquilo que ela nos faz sentir. Um modo de consolidar as coisas. De um certo modo, pôr as coisas em pratos limpos. Precisamos das palavras para ter a certeza do que sentimos. Precisamos das palavras para acreditar que é mesmo aquilo. Porque o que sentimos nem sempre é assim tão claro. Precisamos das palavras para tornar mais real o que os gestos tentam transmitir. 

estória §111


As coisas nem sempre são como queremos. Os dias nem sempre correm bem. E problemas aparecem. Confusões surgem. Mal entendidos se instalam. E depois uma coisa leva a outra. E tudo fica cada vez mais confuso. Ficamos mais predispostos a ver o lado negativo das coisas. A pôr em causa tudo o que tomávamos como certo. E a nossa cabeça é um turbilhão de ideias baralhadas, desorganizadas, algumas delas disparatadas e sem lógica nenhuma. Mas que num momento assim, turvam-nos a visão e ganham lógica por elas próprias. E não somos nós, não somos o que realmente sentimos, não somos o que realmente queremos ser. Mas o tempo ajuda. Ajuda a que a tempestade passe e o mar volte a ser sereno, que bate ao de leve na areia. Dias melhores virão. Afinal davam melhorias para a próxima semana. E a Primavera está à porta. Por isso, dias melhores virão de certeza.

estória §110


E estar ali, fora da cidade, mesmo que num ambiente cheio de pessoas. Naquele momento tudo estava sereno, quieto. Apenas alguns passos se ouviam por vezes no corredor. Se olhasse pela grande janela via um jardim e árvores. Um espaço enorme sob um céu azul. Ela está a chegar. E por momentos consegui ouvir aqueles bichinhos pequenos como que a falarem. Se olhasse pela grande janela via um jardim e árvores. E nas árvores saberia que estavam pássaros, apenas pelos sons que faziam. Foi neste exacto momento que me lembrei dela. Sim, ela está mesmo a chegar. 

estória §109


É um medo enorme que me anda a atormentar os dias. O sobressalto constante. Os pensamentos de tudo e mais alguma coisa a circularem na minha cabeça. O coração acelerado que parece que vai sair do peito. E o desejo de pegar em mim e só em mim e fugir. Ou melhor desaparecer. Não pensei que crescer fosse tão difícil. Não pensei que me “atacasse” desta forma. Mais preocupações. Mais dúvidas. Mais incertezas. Mais responsabilidades. Mais o “meu eu” que fica em jogo. Mais riscos. Menos tempo. Menos confiança. Menos esperança. Menos certezas. Menos vontade. A vida realmente não é como queríamos que fosse. Só quando estamos no momento é que sabemos como estamos, o que sentimos. E sinto medo. Se fosse criança poderia ir correr para os braços de alguém e ficar ali aninhada. A sentir o calor do outro. E isso seria normal. Mas agora não posso simplesmente correr e deixar tudo para trás, como os brinquedos. Agora é preciso ficar quando a vontade é ir. Agora é preciso mostrar de que se é capaz quando não acreditamos. Agora é preciso enfrentar um mundo quando não temos confiança. Agora é preciso ser adulto quando apenas queríamos voltar a ser criança. Queria ter certezas. Queria sentir-me segura de mim. Daquilo que sou. Daquilo que consigo fazer. Daquilo que sou capaz. Mas é tão difícil. É tão difícil quando não acreditamos. É tão difícil quando estamos perante os outros que esperam algo de nós. É tão difícil quando nos podem apontar o dedo. É tão difícil quando não temos o nosso “suporte”. É tão difícil quando não sabemos o que vai acontecer. É tão difícil quando saímos da nossa zona de conforto. Sim, é difícil e dá medo.

estória §108


E por vezes temos a mania de pensar no que já aconteceu. Onde nos encontrávamos a tal dia, a fazer o quê, com que pessoas. Algo que acontece despoleta esse pensamento, vai buscar essa lembrança já tão bem arrumada, algo que pensávamos já termos esquecido. Afinal não. Afinal está lá. Ainda está lá. E isso pode ser bom. Podemos relembrar momentos fantásticos com pessoas de quem gostamos. Podemos sorrir com isso. E isso pode ser menos bom. Pode ser uma lembrança daquelas que são mesmo para ficar sempre adormecidas, sempre lá muito bem guardadas. Por vezes é melhor não pensar no que já aconteceu. É passado. Já lá vai. É melhor pensar no que há agora, no que está a acontecer agora. Onde nos encontramos agora, o que andamos a fazer, com que pessoas estamos. É nisso que temos que pensar.

estória §107


Era tão agradável ouvi-la falar dele. A sua voz calma e melodiosa, onde em cada palavra se sentia ternura. E era ainda mais uma doçura ver como o corpo dela falava sobre ele, como os seus olhos brilhavam, como o sorriso se desenhava na sua cara. Tudo queria transmitir o mesmo. Amor. E eu pensei, ‘um dia também quero falar assim de alguém’. Ela estava na outra mesa a falar sobre ele sem ele lá estar. Contava como ele lhe tinha roubado um beijo um dia e como ela fizera cara de zangada e lhe dissera que o achará atrevido. Mas no fundo, ela confessara agora que tinha gostado. Contou depois como ele era gentil e um verdadeiro cavalheiro, que lhe abria sempre a porta para ela passar, que falava de forma doce com ela, que a punha sempre em primeiro lugar e se lembrava sempre dela. Disse também que ele era muito divertido, que a punha bem-disposta e sabia ter uma boa conversa com ela e com qualquer outra pessoa. E eu pensei, ‘eu quero isto, eu quero alguém assim’. Ele voltou depois de ter ido comprar os seus jornais e deu-lhe para a mão um pacotinho. Ela abriu e sorriu, eram castanhas assadas quentinhas. Ela voltou e disse, ‘era isto que eu falava, estão a ver?’. 

estória §106


Esperar pelo melhor e preparar-se para o pior: eis a regra. 
(Fernando Pessoa)

E se uma pessoa só cumpre uma parte da regra? Se uma pessoa só espera pelo melhor e não faz mais nada? Se uma pessoa só faz isto, acontece o que acontece quando não se cumprem as regras. Como qualquer criança que fica de castigo. Como qualquer adulto que paga uma multa. Sofre-se as consequências. E não, não estamos preparados. Se tivéssemos, não haveria castigo nem multa. Por vezes é difícil. Entramos num mundo nosso, onde as coisas correm bem e as expectativas chegam, mesmo que não as queiramos ter. Elas chegam e nem pedem com licença para entrar na nossa cabeça e no nosso coração. Quando nos apercebemos já elas estão bem instaladas num cantinho escondido, com raízes já criadas e tudo. Acho que são tipo ervas daninhas. Tornam-se em ervas daninhas se não temos cuidado. Se não cumprimos a outra parte da regra. Se não nos prepararmos para o pior. Sem isso, temos que lidar com a situação. Temos que arranjar forças a dobrar e tentar arrancá-las de lá. Custe o que custar. Se elas ficarem, vão-se tornando maiores e vão conquistando mais território. E depois é ver expectativa atrás de expectativas. De uma forma tão descontrolada que aflige um coração só de pensar. Antes que isto tome estas proporções temos que arranjar forças, vindas lá bem do fundo onde pensávamos que já não houvesse. Cortar o mal pela raiz. Após isso, é tratar do terreno e pô-lo como novo. E, muito importante, prepararmo-nos para o pior e só depois esperar pelo melhor.

estória §105


Às vezes é preciso mudar. Fazer mudanças na nossa vida. Pequenas coisas diferentes no nosso dia-a-dia, na nossa casa, em nós próprios, na forma como lidamos com os outros. Pequenas coisas que fazem diferença na forma como vivemos e como vemos a vida. Podemos não pensar que essas pequenas coisas não são suficientes, porque pensamos que são pequenas demais. Mas são essas que fazem a maior diferença. Uma simples troca de móveis e umas almofadas e umas fotos novas e a casa parece outra. Acordar, espreguiçar e pensar nas coisas boas que vão acontecer e o dia já está a começar bem. Andar com um sorriso na cara, faz logo diferença para os outros que se cruzam connosco. Uma mensagem com apenas “Olá!” de alguém que gostamos e a felicidade estampa-se logo no nosso rosto. Basta um gesto, uma atitude, uma palavra, basta qualquer pequena coisa para tornar tudo diferente. Às vezes só queremos isso, só precisamos disso.