estória §67


Hoje apercebi-me que não sabia o que fazer contigo. Não sabia onde te pôr agora que não te trago comigo. Já te tinha deixado ficar, é certo. Já o tinha feito desde aquele dia (que para ser sincera, já não me lembro bem quando foi, só vendo, mas ainda bem que não o sei com precisão). Mas tinha-te apenas deixado para trás. Não estavas em lado nenhum. Não é que te vá pôr um lugar especial. Não o mereces. Mas também não te quero deixar assim no vazio. O vazio é algo demasiado grande para ti. E hoje descobri o sítio onde te devia pôr. Pois foi. Eu tirei-te daquela caixa coberta de pó que estava cheia de coisas antigas. Tu és antigo para mim. E estavas lá juntamente com todas as outras coisas da minha infância. Agora… Agora vou-te colocar numa gaveta onde já existem coisas antigas que não me fazem falta. Mas as quais vou guardar. Numa gaveta daquela estante que são só gavetas. Vais ficar lá. Porque lá, nessa gaveta que estou a falar, estão as coisas que de algum certo modo foram importantes para mim num dado momento. Sim. Podes não o ser agora. Mas tiveste alguma importância para mim. E assim guardo-te com um certo carinho que uma pessoa tem pelas coisas antigas. Aqueles objectos que nos fazem recordar de certos momentos. E que [anos mais tarde] nos deixam com um leve sorriso no rosto. Ainda não o sei. Mas tu vais-me deixar com esse sorriso. Um dia. Vais ser uma recordação, um momento feliz do meu passado. E por isso vou-te guardar naquela gaveta. Juntamente com as outras coisas. Tem lá espaço mais que suficiente para ti. Agora já não tinha qualquer sentido eu ter uma gaveta só para ti. Não podias ter assim tanto da minha atenção e do meu tempo. Não o mereces. Assim ficas na gaveta das coisas antigas. Das quais só nos lembramos que estão lá quando a abrimos. E ficamos parvos por ter lá aquilo. E depois… Depois vem o leve sorriso no rosto.

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